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Cogumelos Aquáticos 2
 
Macrofungos aquáticos

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Outras espécies aquáticas e anfíbias

 

Peziza é um gênero Ascomycota com diversas espécies terrestres, recentemente foi descrita uma espécie com frutificação submersa na América do Norte (P. oliviae), além de algumas crescendo em áreas alagadas na Europa (como P. nordica). Possuem o chapéu em forma de cálice, de cor acastanhada em tons de verde-oliva a marrom-alaranjado. P. oliviae é pequena, medindo até 2,5 cm, mas P. nordica pode atingir grandes dimensões, há registros de até 8 cm.


Scutellinia scutellata é um cogumelo Ascomycota comum, encontrado nas Américas, Europa, Ásia e Oceania, inclusive no sul do Brasil (SC e RS). Possui diversos nomes populares em inglês, como "eyelash cup" e "Molly eye-winker", pelas cerdas escuras nas margens do chapéu, lembrando cílios. Medem até 1,5 cm, com uma bela coloração vermelho-alaranjada. Embora seja uma espécie terrestre, há diversos reportes desta espécie frutificando em troncos submersos, talvez seja um ótimo exemplo de espécies de cogumelos adaptados a submersão ocasional. 




Scutellinia scutellata, foto de Lucien Rommelaars, Freenatureimages (Licença Creative Commons, veja a imagem original aqui).


Scutellinia scutellata, fotografada em Santana de Parnaíba, SP. Foto de Fernando Barletta. 





Hypocreales aquáticas

 

Hypocreales é uma ordem de fungos Ascomycota com sete famílias e próximo de 3000 espécies. Na sua maioria são saprófitas ou endofíticas, sendo encontradas em madeira em decomposição, crescendo sobre plantas, algas ou mixomicetos. Algumas são parasitas, como o conhecido Cordyceps. Algumas poucas causam infecções oportunísticas, inclusive no homem. São caracterizados pela presença de corpos frutificantes de coloração brilhante, as mais comuns de cor amarelo, alaranjado ou vermelho.

Embora suas estruturas reprodutoras sejam bem pequenas, menores do que 1 mm, costumam ser bem visíveis devido à sua coloração brilhante. Pela dimensão dos "cogumelos", talvez não devessem ter sido incluídos neste artigo, mas decidimos fazê-lo, porque há registro de uma espécie desconhecida de fungo deste grupo em aquários ornamentais de camarões em São Paulo, SP (fotos abaixo).
 
São encontradas
diversas espécies aquáticas, geralmente crescendo em troncos em decomposição submersos. Algumas poucas são marinhas. Alguns exemplos das duas famílias que deve incluir a espécie brasileira são Aquanectria, Cosmospora, Mariannaea, Varicosporella (Nectriaceae), Bionectria e Lasionectria (Bionectriaceae).  




 











Diminutos peritécios que surgiram em troncos submersos em aquários de camarões anões em São Paulo, SP. Provavelmente das famílias Nectriaceae ou Bionectriaceae. A última imagem mostra uma régua, para escala. Fotos gentilmente cedidas por Mil Marques.





Líquens aquáticos

 

Os Líquens são organismos essencialmente terrestres, constituídos por uma simbiose entre um fungo (o micobionte) e uma alga ou cianobactéria (fotobionte ou ficobionte). Pelo ICBN, o termo “líquen” está em desuso, sendo mais adequado o termo fungos liquenizados.

 

Embora raros, os líquens invadiram também ambientes aquáticos, tanto de água doce quanto litorais marinhos. São seres que necessitam de exposição solar para sobreviver, não sendo, portanto, encontrado em águas profundas. São mais frequentes em locais rasos e alagados, muitas vezes na interface entre a porção emersa e submersa destes habitats, e preferem temperaturas baixas. Precisam de um substrato rígido para se fixarem, por exemplo, grandes rochas ígneas. Por este motivo, são mais comuns em riachos de águas ácidas. No mar, são frequentes em costões rochosos de clima temperado.


 


Líquen anfíbio Ionaspis lacustris, fotografado em um riacho montanhoso em Angus, Escócia. Foto gentilmente cedida por David Genney.



Espécies que vivem permanentemente submersas são muito raras, com menos de dez espécies de clima temperado do hemisfério norte capazes de sobreviver anos submersos (como o Hydropunctaria rheithrophila). Outras cerca de 170 espécies no mundo são encontradas em habitats de água doce, mas são tipicamente submersos temporariamente, talvez sejam mais bem classificados como anfíbios ao invés de aquáticos. Podemos citar como exemplos alguns líquens dos gêneros Leptogium, Peltigera, Dermatocarpon, Verrucaria, Collema, Ionaspis Koerberiella.





Peltigera hydrothyria, fotografada no Parque Nacional Great Smoky Mountains, Sevier Co., Tennessee, EUA. Foto de Jason Hollinger, Mushroom Observer (Licença Creative Commons, veja a imagem original aqui).







Líquens em rochas parcialmente submersas, fotografados em um riacho no Parque Serra do Japi, Jundiaí, SP. Fotos de Walther Ishikawa.



Descrições de espécies brasileiras são quase ausentes na literatura, somente com um único reporte de Ephebe brasiliensis (um cianolíquen de cor enegrecida) encontrada em MG, SP, SC e RS.





Líquen anfíbio Ephebe brasiliensis, fotografados no Parque Nacional Serra Geral, em Cambará do Sul, RS. A escala na segunda foto tem 1 cm. Imagens extraídas de Gumboski EL, et al. Rodriguésia 2019 (Licença Creative Commons, veja o artigo original aqui).



Pode-se dizer que líquens são seres especializados em viver em ambientes inóspitos, sendo excelentes colonizadores primários. São encontrados em desertos e topos de montanhas rochosas, onde poucos organismos conseguem sobreviver. Litorais marinhos se encaixam neste tipo de habitat, com fortes ondas, emersão e submersão, elevada salinidade, variações amplas e bruscas de parâmetros.




Fotografia da costa rochosa norte de Cap Sizun (Beg al Lochou, Goulien, Finistère, Bretanha, França),  mostrando os cinturões de algas e líquens. Foto de Jymm (Wikimedia, Licença Creative Commons, veja o arquivo original aqui).



Um ótimo local para começar a apreciar e estudar líquens são justamente estes litorais rochosos marítimos, especialmente em climas temperados. Estes líquens associados a ambientes de água salgada formam ricas comunidades, organizadas em evidentes faixas coloridas nas rochas sujeitas à ação do mar. Chamadas de bio-bandas ou zonas, representam diferentes espécies de líquens (junto a outros organismos) adaptados a condições específicas de submersão e salinidade, ou seja, em viverem a alturas específicas em relação ao nível da maré. Classicamente são caracterizadas quatro zonas (com três zonas superiores associadas):


Zona sublitoral: submersos, exceto em marés bem baixas. Esta zona é colonizada essencialmente por algas, líquens que conseguem sobreviver a submersão permanente são absoluta exceção, como a Verrucaria serpuloides, já coletada a mais de 30 metros de profundidade, na Antártida.


Zona litoral: região frequentemente submersa, no entre-marés. Alguns chamam líquens habitantes desta zona como líquens marinhos. Sua metade superior é muitas vezes chamada de “franja litoral”, ou Cinturão Negro, por ser dominada por líquens de cor enegrecida, principalmente Verrucaria. Podem ser vistas a quilômetros de distância, de perto nem parecem líquens, lembrando manchas de carvão, podem até ser confundidos com manchas de petróleo derramado. Diminutos Collemopsidium são encontrados na metade inferior desta zona, aderidas a cracas e moluscos, chamando esta região de Cinturão Cinza das Cracas.


Zona supralitoral (ou costal): raramente submersa, mas sujeita a extensa borrifação de água salgada. Sua metade inferior é chamada de Zona Mésica, com um Cinturão Laranja inferior (dominado por Caloplaca) e um Cinturão Amarelo superior (dominado por Xanthoria). Líquens nesta zona são chamados por alguns de líquens marítimos.


Zona terrestre: zona pouco afetada por borrifo, muitos excrementos de aves marinhas, um Cinturão Branco formado por líquens crostosos como Ochrolechia, Lecanora e Tephromela. Dois grupos de líquens constituem estas populações: líquens halofílicos (encontrados somente em áreas com alguma salinidade) e líquens halotolerantes (líquens comuns, mas tolerantes à salinidade).


Zona xérica: pouca borrifação, mas condições inóspitas de ressecamento e inundação. Corresponde ao Cinturão Cinza, dominado por Ramalina.


Zona halofílica ou aerohalina: zona terrestre pouco afetada pelo borrifo marinho. Plantas tolerantes à salinidade começam a aparecer nesta região. Pode se estender por até quilômetros continente adentro.


Zona oceânica: extensas áreas litorâneas sujeitas ao clima oceânico.





Líquens marinhos fotografados no litoral francês, na Zona Litoral. Nas duas primeiras fotos são visíveis Collemopsidium elegans, e nas duas últimas Verrucaria halizoa. Nas três fotos podem ser vistas também Wahlenbergiella striatula. Duas primeiras fotos no Pointe du Toulinguet, a última em Camaret-sur-Mer. Todas as fotos cortesia de Michel David.




Líquen marinho Collemopsidium foveolatum crescendo sobre conchas de ostras e mexilhões. Fazem parte do Cinturão Cinza da Zona Litoral. A primeira foto no Pointe Armorique, a segunda no Camaret-sur-Mer, França. Fotos cortesia de Michel David.



Outro fenômeno interessante, mais comum em ambientes marinhos, é a inversão de papéis entre o fungo e o fotobionte, o fungo tornando-se um endocomensal da alga. É chamado de micoficobiose, ou líquen invertido. Em rios, há o caso do Phaeospora lemaneae (crescendo dentro de Lemanea, que ocorre no Brasil), e no mar, os casos mais conhecidos são de Blodgettia confervoides (em Cladophora, também encontrado aqui) e Mycophycias ascophylli (em Ascophyllum nodosum e Pelvetia canaliculata).






Três espécies marinhas de Hydropunctaria fotografadas no litoral francês, novamente da Zona Litoral. Respectivamente, H. amphibia (em Pointe de Rulianec), H. oceanica (em Pointe de Lostmarc´h) e H. orae (Le Fret). Fotos cortesia de Michel David.



Verrucaria ditmarsica (em La Fraternité), outro líquen marinho do litoral francês. Foto cortesia de Michel David.



Esta estratificação também está presente em rochas parcialmente submersas nas margens de rios, mas de forma mais sutil, já que a variação no nível de água é menor. Nos rios, são estratificados em quatro camadas ou zonas: submersa, mésica fluvial, xérica fluvial, e terrestre fluvial. Também formam faixas de cores distintas, a mais superior chamada por alguns de "linha de líquen".




Caloplaca marina, um típico líquen da Zona Mésica Supralitoral. Fotografado no litoral francês, em Le Loc´h. Foto cortesia de Michel David.









Bibliografia:

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Agradecimentos aos colegas aquaristas Mil Marques, Fernando BarlettaFelipe Duarte, Arno J. Krumenauer, Claudemir M. Moreira, Euclides Moraes, Lucas A. Santo, Gilberto Almeida, Lucas JesusOhsnapitsjaycee (usuário Reddit, Filipinas), Nick Visser (Canadá), aos fotógrafos e micologistas David Genney (Escócia), Dr. Dennis Edm Desjardin (EUA), Zdenka Kryspínová (República Tcheca, veja seu site AtlasHub aqui), Marek Čapoun (República Tcheca, veja seu site Houby Znojemska aqui), Filip Fuljer (Eslováquia), aos colegas da Mycologues Associes (França, veja seu site aqui) e a Michel David (da equipe do portal francês Lichen Maritimes, visite aqui) pela cessão das fotos para o artigo. Somos gratos também aos micologistas Fred Spiegel, Leanne Gallon e Edvin Johannesen pelas informações e auxílio na identificação dos fungos brasileiros. Agradecimentos especiais ao Dr. Robert A. Coffan (EUA), um dos micologistas que descobriu a Psathyrella aquatica, nos cedeu imagens e um vídeo inédito, e valiosas informações.


As fotografias de Walther Ishikawa, aquelas extraídas de Gumboski EL, et al (Rodriguésia 2019), Nicolas Van Vooren (Ascomycete.org), Chris Hay (Mushroom Observer), Jimmie Veitch (Mushroom Observer), Jason Hollinger (Mushroom Observer), Jan Nijendijk (Freenatureimages), Lucien Rommelaars (Freenatureimages), Jan de Laat (Freenatureimages) e Jymm (Wikimedia Commons) estão licenciadas sob uma  Licença Creative Commons . As demais fotos têm seu "copyright" pertencendo aos respectivos autores.

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