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"Euryrhynchus"  
Artigo publicado em 12/05/2012, última atualização em 18/03/2023  



Euryrhynchus – Euryrhynchus spp.

 

Nome em português: Camarão de água doce, Camarão de rio.

Nome em inglês: Amazon Zebra Shrimp, Peru Zebra Shrimp, Blue Banded Shrimp.

Nome científico: Euryrhynchus Miers, 1877

  • Euryrhynchus amazoniensis Tiefenbacher, 1978
  • Euryrhynchus burchelli Calman, 1907
  • Euryrhynchus pemoni Pereira, 1985
  • Euryrhynchus taruman Pachelle & Tavares, 2018
  • Euryrhynchus tomasi De Grave, 2007
  • Euryrhynchus tuyuka Pachelle & Tavares, 2018
  • Euryrhynchus wrzesniowskii Miers, 1878

Origem: norte da América do Sul (Bacia Amazônica, Orinoco e costais)

Tamanho: até 2 cm
Temperatura da água: 28-32° C
pH: 4,0-6,5

Dureza: mole
Reprodução
: especializada, todo ciclo em água doce

Comportamento: pacífico
Dificuldade: médio

 

 

Apresentação

            O “Euryrhynchus” é um pequenino camarão amazônico de água doce, pouco conhecido e pouco disponível no hobby. Este gênero é relativamente comum em igarapés da floresta amazônica, é exportada para os mercados aquarísticos internacionais (embora em pequeno número), e algumas populações já são criadas há algum tempo por aquaristas alemães e franceses. É mais um daqueles tristes casos de espécies brasileiras que são mais disponíveis no exterior do que aqui. Entretanto, mesmo no exterior, não é uma espécie comumente vista nas lojas.

            São camarões bem miúdos, não ultrapassando 2 cm, menores ainda do que os Potimirim. Machos possuem grandes garras, podendo até ser confundidos com lagostins.

São consumidos regularmente pelas populações indígenas, são conhecidos pela tribo Ye´Kuana (Venezuela) como "Shuru".


            Euryrhynchidae ganhou recentemente o status de família, deixando de fazer parte dos Palaemonidae. Contém somente nove espécies conhecidas, são sete espécies de Euryrhynchus sul-americanos, provavelmente todos ocorrendo no território brasileiro, e dois gêneros monotípicos africanos (Euryrhynchoides e Euryrhynchina), uma distribuição tipicamente Gondwaniana, semelhante aos Atya e Cardisoma. Dentre os Euryrhynchus, a espécie mais comum e mais bem estudada é o E. amazoniensis.

            Etimologia: Euryrhynchus vem do grego eurys (largo) e rhýnchos (tromba, bico). Em relação aos epítetos específicos:

  • amazoniensis significa nativo do Amazonas
  • burchelli é uma homenagem a William John Burchell, explorador e naturalista inglês, que coletou o espécime-tipo
  • pemoni vem de "Pemon", o nome genérico dado às populações indígenas da região La Gran Sabana, Venezuela
  • tomasi é uma homenagem ao aquarista Joachim Tomas, que coletou o espécime tipo
  • wrzesniowskii é uma homenagem ao zoólogo polonês August Wrzesniowski
  • taruman vem do nome do Igarapé Tarumã-Mirim, onde foi coletado o espécime-tipo
  • tuyuka é uma homenagem à tribo indígena amazônica Tuyuka, que realiza a dança tradicional "Dasia Basa" (dança do camarão) durante alguns rituais






Euryrhynchus amazoniensis, fêmea ovada, fotos de Werner Klotz.


Origem

Os Euryrhynchus têm distribuição restrita à porção norte da América do Sul, na Região Amazônica, sendo encontrada no Peru, Colômbia, Venezuela, Guiana, Suriname, Guiana Francesa e Brasil (estados do AP, AM, PA, RO, RR), incluindo bacias costeiras do norte, do Orinoco e Amazonas. A espécie com distribuição mais ampla é o E. amazoniensis. A única espécie que não tem registros no Brasil é o E. tomasi, mas ocorre na Venezuela e Guiana próximo à divisa com Roraima, com ocorrência provável também em território brasileiro. 

 Estão presentes nos três grandes tipos de sistemas aquáticos da Bacia Amazônica, águas brancas, águas claras e águas pretas. Podem ser encontrados tanto em rios, lagos e pequenos igarapés florestais, quanto nos ambientes periodicamente inundáveis das matas de várzea dos rios de água branca, ou nos igapós dos sistemas de água preta e clara. São mais frequentes em ambientes sem ou com pouca correnteza, rasos, de águas ácidas e pobres em nutrientes, geralmente ao longo da linha marginal, comumente encontrados em bancos de serrapilheira submersa, locais com grande quantidade de folhas e galhos recobrindo o fundo do rioSão encontrados abaixo e entre estas folhas submersas, podendo formar grandes populações.

Vivem formando grandes colônias, muitas vezes são simpátricos e sintópicos entre as várias espécies de Euryrhynchus, mas parece haver uma preferência por habitats distintos, permitindo esta coexistência. Por exemplo, o E. amazoniensis tende a habitar águas mais rasas e periodicamente inundáveis do que o E. burchelli.

Sua distribuição estende-se além do bioma da floresta amazônica, sendo encontrado também em riachos do cerrado (por exemplo, no Amapá), e em pequena quantidade até em manguezais com água salobra. Algumas espécies mais típicas de bacias costeiras parecem ter distribuição preferencial por estes habitats, como o E. tomasi






Distribuição geográfica das diversas espécies de Euryrhynchus. Imagem original Google Maps; dados de Pachelle & Tavares, 2018.












Igarapé do Rio Negro, em São Gabriel da Cachoeira (AM), onde foram encontrados muitos Euryrhynchus. Expedição feita pela equipe do Wirbellosen-Auktionshaus, a galeria completa pode ser vista  aqui .







Euryrhynchus amazoniensis, macho, foto de Chris Lukhaup.


Aparência

 

Têm um aspecto bem semelhante aos demais camarões dulcícolas, com corpo alongado, pequeno e transparente. O segundo par de pernas é transformado em potentes garras, maiores em machos, os quais possuem dentes grandes e agudos na região basal do hiato, e muitas cerdas. Carapaça lisa, possuem somente o espinho antenal, que se estende até metade da córnea. Olhos próximos, e pouco pedunculados. Possui um rostro muito curto, do comprimento aproximado da córnea. Numa visão dorsal, estes camarões possuem a extremidade distal do cefalotórax relativamente larga, conferindo um aspecto curto e “achatado” à sua face, daí seu nome científico.

            Sua coloração é extremamente variável, desde indivíduos praticamente transparentes até animais opacos e escuros. O mais comum é cinzento claro, tendendo para azul-esverdeado ou castanho-avermelhado. Geralmente possuem manchas e faixas no abdômen, de uma coloração azul ou vermelha, com um aspecto zebrado. As pernas não são pigmentadas. Machos medem até 2,0 cm, e as fêmeas até 1,6 cm.

As diversas espécies de Euryrhynchus têm aspecto muito parecido, podem ser diferenciados somente com maior magnificação, com análise dos espinhos dos artículos e carapaça, e apêndice masculino. A identificação específica de animais vivos é muito difícil, ainda mais por serem camarões tão pequenos. Uma forma de identificação grosseira é através do padrão de espinhos na quela (segundo pereiópode), e carapaça:

  • Sem espinhos, nem no mero, nem no carpo - E. wrzesniowskii
  • Mero sem espinhos, carpo com espinho no ângulo distomesial. Margem anterior da região pterigostomial:
    • Protruso anteriormente num dente agudo e triangular - E. amazoniensis
    • Arredondado ou protruso anteriormente, num dente largo e achatado - E. tuyuka
    • Arredondado ou largamente angular, não protruso - E. taruman
  • Mero com um espinho no ângulo distomesial, carpo sem espinhos - E. pemoni
  • Mero com dois espinhos, um em cada ângulo distoventral:
    • Carpo com espinho no ângulo distomesial - E. burchelli
    • Carpo sem espinhos - E. tomasi


 





Euryrhynchus cf. pemoni, fotografados na Guiana por Johan Chevalier, e Hadrien Lalagüe (Guyane Wild Fish Association).



Euryrhynchus taruman, foto de Joel Braga Mendonça. Extraído de Pachelle PPG 2016.




Euryrhynchus tomasi, foto de Chris Lukhaup.




Euryrhynchus tomasi, fotos de Joachim Tomas e O. Helker. Primeira imagem extraída de De Grave & Fransen 2011 (Licença Creative Commons, veja o artigo original  aqui  ). Segunda imagem do Museu de História Natural da Universidade de Oxford.





Euryrhynchus wrzesniowskii, fotografados na Guiana por Hadrien Lalagüe e Grégory Quartarollo. Fotos de Guyane Wild Fish Association.



Parâmetros de Água

 

Embora na natureza sejam encontrados em todos os sistemas amazônicos, as populações comercializadas parecem ser todas oriundas de habitats de águas pretas, demandando a criação em condições semelhantes a estes locais. São camarões sensíveis, que só pode ser mantidas e reproduzidas em águas ácidas e extremamente moles. Se criado em condições inadequadas, se tornam susceptíveis a infecções bacterianas.

Preferem águas quentes, com temperatura entre 28 e 32° C. São águas negras, bastante ácidas (pH de 4,0-6,5) e de baixíssima dureza, rica em húmus e taninos, e pobre em minerais e nutrientes.





Euryrhynchus amazoniensis, macho originário do Peru, foto de Chris Lukhaup.



Euryrhynchus amazoniensis, fêmea ovada, foto de Chris Lukhaup.



Dimorfismo Sexual

 

Geralmente a distinção é fácil, os machos atingem maiores dimensões, e também possuem garras mais desenvolvidas, com dentes maiores e mais cerdas. Fêmeas possuem pleuras abdominais arqueadas e alongadas, formando uma câmara de incubação. Este achado é bem mais evidente do que em outras espécies, por ser um animal tão pequeno, e com ovos tão grandes. A olho nu, as fêmeas tem um aspecto "barrigudo" por causa das pleuras expandidas. Também podem ser diferenciados pela análise dos órgãos sexuais, mas isto é bem difícil em animais vivos.



Euryrhynchus amazoniensis, macho, foto de Chris Lukhaup.




Casal de Euryrhynchus amazoniensis, fotos de Chris Lukhaup.


Reprodução

 

O termo “reprodução especializada” é usada de forma imprecisa pela maioria dos aquaristas, por questões práticas. Na realidade, a maioria das espécies consideradas como sendo de “reprodução especializada” (Macrobrachium jelskii, Red Crystal, Red Cherry) são do tipo II, Parcialmente Abreviado, com duas a três fases de zoea. Poucos camarões têm um ciclo Tipo III – Completamente Abreviado (somente uma fase larval), como o Macrobrachium hendersodayanum (sul-asiático) e Desmocaris trispinosa (africano).

Das espécies brasileiras, os únicos camarões com este padrão (chamado por alguns de “extremamente abreviada”) são os Euryrhynchus. Alguns autores se referem a este padrão como de “desenvolvimento direto”, porque apesar de existir uma fase de larva, funcionalmente estes já se comportam como juvenis.

Dos ovos nascem larvas bastante desenvolvidas, medindo 4 mm, e já com comportamento bentônico. Morfologicamente lembram bastante os camarões adultos, mas ainda não possuem urópodos, e o telson é espatulado (o que os caracteriza como larva). Nesta fase não se alimentam, consumindo nutrientes do seu saco vitelínico. Após dois a cinco dias ocorre a primeira muda, e já se tornam juvenis.

Uma observação interessante é que duas espécies brasileiras (E. burchelli e E. wrzesniowskii) têm um padrão reprodutivo ainda mais abreviado do que os demais Euryrhynchus, a larva já nasce com as peças bucais bem formadas, e se alimenta normalmente. É possivelmente o grau mais avançado visto dentre todos os camarões Carídeos.

O período reprodutivo varia com as populações, para aquelas que vivem em locais de inundações sazonais, o período coincide com as épocas de “enchente” na floresta amazônica (novembro-dezembro e junho-julho), enquanto as populações dos igarapés florestais têm reprodução contínua ao longo do ano. 

Tipicamente as fêmeas carregam de 9 a 30 ovos, grandes e alongados, que medem até 1,7 mm no seu maior diâmetro. As grandes dimensões dos ovos se tornam mais evidentes se lembrarmos que as fêmeas ovígeras medem em média 1,6 cm. Os ovos têm uma cor verde pálida de início, se tornam laranja-acastanhados com seu desenvolvimento. Estes não eclodem simultaneamente, demorando de dois a três dias para a eclosão de todos os ovos de uma ninhada. A eclosão geralmente se dá à noite.





Close nos grandes ovos do Euryrhynchus amazoniensis, foto de Werner Klotz.



 


Euryrhynchus amazoniensis, foto cedida por Rayon Vert Japan.


Comportamento

 

Apesar das grandes garras, são animais pacíficos, não brigam com outros animais nem com camarões da mesma espécie. Pelo contrário, por serem pequenos, são presas fáceis para peixes e outros predadores, deve-se escolher cuidadosamente seus companheiros de aquário, evitando espécies grandes ou agressivas. Em especial, tornam-se vulneráveis após a ecdise.

São camarões gregários, formando grandes colônias na natureza, desta forma sugere-se a manutenção desta espécie em grupos.

Tímidos, costumam ficar ocultos durante o dia, entocados em meio às folhas submersas da serrapilheira (uma boa opção em aquários é a amendoeira), saem à noite para se alimentar. Desta forma, preferem ambientes mais sombreados, sem iluminação forte, se beneficiando de plantas flutuantes.

É uma opção interessante de invertebrado para tanques amazônicos com pequenos tetras, mas o ideal é que sejam mantidos sozinhos, especialmente se a idéia é reproduzi-los.

 


Euryrhynchus amazoniensis, fêmea ovada, foto de Werner Klotz.





Euryrhynchus amazoniensis macho, fotos de Chris Lukhaup



Alimentação

 

Possuem alimentação onívora e detritívora, mas com tendências carnívoras. Na natureza, sua dieta principal é composta de fungos, material vegetal, tecamebas, esponjas, larvas de insetos, oligoquetas e outros pequenos invertebrados aquáticos. Aceitam bem ração industrial, mas é interessante a complementação com alimentos de origem animal.

 



Trio de Euryrhynchus amazoniensis, animais importados do Perú, com uma belíssima coloração azulada. Fotos de Brian Ma.





Imagens do macho de Euryrhynchus amazoniensis, notem as grandes garras. Fotos de Brian Ma.





Fêmeas de Euryrhynchus amazoniensis, uma delas ovada. Fotos de Brian Ma.


Bibliografia:

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  • http://www.crusta-fauna.org/crevettes/euryrhynchus-amazoniensis/
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Agradecimentos ao colega aquarista canadense Brian Ma e à equipe do Rayon Vert Japan, uma importadora japonesa de peixes ornamentais, representado pelo Sr. Nagamatsu, pela cessão da imagem para o artigo. Brian mantém um pequeno canal informativo sobre seus animais, centrado no  Fishopolis88 . Somos também gratos ao zoólogo Paulo Pachelle Pinheiro Gurgel, por valiosas informações na atualização do artigo em 2020, e por permitir o uso da imagem da nova espécie descoberta por ele. Também somos gratos à equipe do Wirbellosen-Auktionshaus (visite seu website  aqui , e seu Blog  aqui ) pela cessão das fotos da expedição para o artigo, e também aos biólogos Johan Chevalier ( Réserve Naturelle Régionale TRESOR ) e Gregory Quartarollo ( Guyane Wild Fish Association ). Finalmente, agradecimentos ao Museu de História Natural da Universidade de Oxford pelo uso da imagem do E. tomasi. O aquarista e zootecnista Daniel Pereira da Costa da nossa equipe também contribuiu com informações sobre os diferentes biomas habitados pelos Euryrhynchus



fotografia de Werner Klotz (extraída de De Grave et al. PLoS One 2015) e J. Tomas e O. Helker (extraída de De Grave & Fransen Zoologische Mededelingen 2011) estão licenciadas sob uma  Licença Creative Commons . As demais fotos têm seu "copyright" pertencendo aos respectivos autores.
 
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