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Maria-farinha  
Artigo publicado em 16/12/2013, última edição em 04/06/2022  



Maria-farinha – Ocypode quadrata

 

Nome em português: Maria-farinha, Guaruçá, Guruçá, Guriçá, Aguarauçá, Vaza-maré, Siri-padoca, Papa-defunto, Espia-maré, Caranguejo-fantasma.

Nome em inglês: Atlantic Ghost crab
Nome científico: Ocypode quadrata (Fabricius, 1787)

Origem: Américas, costa atlântica
Tamanho: carapaça com largura de 4,0 cm
Temperatura: 18-32° C
Salinidade: salgada, tolerante a variações
Reprodução
: primitiva, larvas planctônicas marinhas
Comportamento: agressivo
Dificuldade: médio

 

 

Apresentação

            É um caranguejo semi-terrestre bastante comum em praias arenosas. Ariscos e bastante ágeis, são frequentemente vistos correndo rapidamente “de lado” nas praias brasileiras. Na realidade é um animal litorâneo, de praias marinhas, a rigor, nem deveria estar neste álbum de caranguejos estuarinos. Optamos por incluir esta espécie porque perguntas sobre a manutenção destes animais em cativeiro são bem comuns.

            Apesar de comestíveis, não representam uma fonte de alimentação humana significativa. Em algumas regiões, são usados como remédios populares. Como curiosidade, existe um bairro/praia chamada “Maria Farinha” no litoral de Pernambuco.

Etimologia: Ocypode vem do grego termo ōkypod-, ōkypous: ōkys "ágil" + pod-, pous "pés". E quadrata é uma alusão ao formato quadrado da sua carapaça.




Distribuição geográfica de Ocypode quadrata. Imagem original Google Maps; dados de Melo GAS 1996 e demais referências.



Origem e habitat

É um caranguejo semi-terrestre que habita praias arenosas, em litorais marinhos, escavando tocas no terreno seco, bem acima do limite da maré.

Tem ampla distribuição geográfica ao longo da costa atlântica americana, nas três Américas. É encontrado desde Nova Jérsei (EUA) até o estado do Rio Grande do Sul, sul do Brasil, incluindo a ilha brasileira de Fernando de Noronha.





























Maria-farinha em imagem dorsal, mostrando o aspecto quadrado da sua carapaça. Foto de Mário Celso Micaeli.





Maria-farinha juvenil, ainda mostrando sua padronagem mosqueada,
fotos de Carlos A. P. Parchen.


Maria-farinha juvenil, fotografada na Praia da Costa, Vila Velha, ES, foto de Flávio Mendes.



Aparência

 

Cefalotórax de forma quadrada, alta. Pernas dispostas lateralmente, com finas e longas cerdas claras, com um aspecto "peludo". Locomove-se agilmente sobre a areia elevando seu corpo com as pernas. Olhos grandes e negros, alongados verticalmente, protrusos e elevados. Garras de dimensão média, lisas, orientadas para baixo, devido ao seu hábito alimentar. Discreta assimetria nas quelas. É a única espécie de Ocypode presente no Brasil. Pertencem à família Ocypodidae, o mesmo grupo dos caranguejos violinistas (antigo gênero Uca) e o caranguejo-do-mangue (Ucides). Uma análise filogenética recente o coloca muito próximo do chama-maré Uca maracoani.

Espécimes brasileiros com carapaça de até 4 cm. Os animais norte-americanos são maiores, com até 5,5 cm.

        Adultos têm coloração branca-amarelada, região ventral e quelas brancas. Os grandes olhos com córneas negras infladas se destacam bastante no corpo claro. Os filhotes têm outra coloração, em tons de areia irregulares, com um padrão complexo de manchas mosqueadas, visando mimetismo.


 



Casal de Maria-farinha demonstrando o dimorfismo sexual, fotos de Ilha de Itamaracá, PE. A primeira foto mostra um macho, com seu abdomen estreito, e a segunda foto uma fêmea, com abdomen largo. Fotos de Rodrigo Valença.


Dimorfismo Sexual

 

Como quase todos os caranguejos, a distinção pode ser feita facilmente através da análise do abdômen, que fica dobrado sobre a porção ventral da carapaça. Fêmeas possuem o abdômen largo, onde incubam seus ovos. Nos machos, o abdômen é estreito.




Cópula de Maria-farinha, fotografado na Ilha do Cardoso, SP. Foto de Ricardo Moura.




Maria-farinha, fotografado
em Natal, RN. Fêmea ovada, note a massa de ovos sobre seu abdomen. Foto cedida por Hector Barrabin.





Larva (Megalopa) de Ocypode quadrata, encontrado nadando junto à superfície do mar, em Gloucester Harbor, fotografado em 26 de Agosto de 2012. Curiosamente, o local de coleta é além dos limites conhecidos de distribuição desta espécie, suspeita-se que seja decorrente de mudanças climáticas. Fotos gentilmente cedidas por Bill O´Connor. O dedo na foto maior é do filho de Bill, de 4 anos.









Juvenil de Ocypode quadrata, encontrado na praia de Tramandaí, RS. Fotos de Roberta Capra.



Reprodução

O acasalamento ocorre em dois picos anuais (primavera e verão) existindo relação entre o período reprodutivo e a temperatura. Reprodução primitiva, gerando um grande número de pequenos ovos, que são liberados no oceano à noite. As larvas se desenvolvem em água salgada, passam por cinco estágios de zoea além da megalopa. O tempo de desenvolvimento larvar é de aproximadamente 34 dias. Juvenis retornam à praia, e passam a ter hábitos terrestres.


 



Maria-farinha junto à sua toca na areia, fotografado em Ilha do Cardoso, Cananéia, SP. A primeira foto do artigo é do mesmo animal. Fotos de André Benedito.


Comportamento

 

Habitam praias arenosas, escavando tocas no terreno seco, bem acima do limite da maré. Animais maiores tendem a escavar tocas em locais mais distantes da água, são mais numerosos a 50~60 metros da praia. Podem alcançar mais de um metro de profundidade, estando geralmente inclinadas, e em forma de “J”. Têm hábitos noturnos, permanecendo entocados durante o dia, saindo à noite para procurar alimentos. Os hábitos noturnos são mais exacerbados nos adultos maiores, indivíduos juvenis são ativos também durante o dia. Sai das suas tocas ao entardecer, e retorna com os primeiros raios da manhã. Nem sempre ocupa a mesma toca que foi utilizada no dia anterior. Em condições desfavoráveis (temperaturas extremas ou chuva), permanece dormente no interior da toca, cuja abertura é fechada pelo caranguejo.

Mostram um comportamento social, com interações agressivas entre indivíduos por território e acasalamento. Além de posturas agressivas, comunicam-se usando sons, mostram um grande repertório de sons, estalando suas garras, com estridulação das suas pernas, além de barulhos de borbulhamento.

Como todos os demais crustáceos, realizam mudas (ecdises) durante o crescimento, abandonando a carapaça antiga (exuvia). Logo após a muda, seu exoesqueleto ainda não é totalmente rígido, sendo vulnerável a ataques. Têm vida relativamente longa, ultrapassando três anos.

      Brânquias internas adaptadas à respiração aérea, suportam um tempo prolongado emersos se o ambiente for úmido. Porém, precisam hidratar diariamente suas brânquias no mar, sendo esta sua primeira atividade ao sair diariamente da toca.


 


Maria-farinha se alimentando de carcaça de peixe trazida pela maré. Foto de Carlos A. P. Parchen.




Maria-farinha predando Vespa parasitóide, filmado em Angra dos Reis, RJ. Estas grandes vespas caçam aranhas, muitas vezes entocadas no solo. Não se sabe se a vespa confundiu a toca do caranguejo com uma de aranha, e acabou sendo predada.
Vídeo cortesia de Ines Seppi.



Alimentação

 

                Carnívoros, essencialmente predadores, mas carniceiros ocasionais. Sua dieta principal depende bastante do ambiente, a maioria das populações se alimenta basicamente de macroinvertebrados filtradores enterrados em águas rasas (como tatuíras e mariscos), o que explica sua anatomia, com as garras orientadas para o solo. Mas outras têm sua alimentação composta de insetos da vegetação costeira, outros ainda de animais mortos trazidos pela maré. Existe um interessante trabalho sugerindo seu uso como agente biológico de controle do caracol invasor Achatina fulica.











Aquaterrário marinho dedicado, projetado para a criação de filhote de Maria-farinha, pela aquarista norte-americana Felicia McCaulley. Note o crescimento do caranguejo entre as fotos. Veja o link do artigo ao final da página.



Manutenção em Aquaterrários

 

Agressivos e caçadores, não podem ser mantidos com outros animais. Não são canibais, exceto em situações extremas. Sua manutenção em terrários é controversa, é possível, mas por ser um animal bastante ativo, necessitam de um amplo espaço. Importante lembrar que a porção aquática deste aquaterrário deve conter água salgada (marinha) ao invés de água salobra ou doce.

 

 

 

Bibliografia:

  • Melo GAS. Manual de Identificação dos Brachyura (caranguejos e siris) do litoral brasileiro. São Paulo: Plêiade/FAPESP Ed., 1996, 604p.
  • dos Santos JRM, Delabie JHC. Controle natural de Achatina fulica (Mollusca, Gastropoda) por Ocypode quadrata (Crustacea, Decapoda) em restinga antropizada de Ilhéus, Bahia, Brasil. Sitientibus série Ciências Biológicas. 2011; 11(1): 94–98.
  • Wolcott TG. Ecological role of ghost crabs, Ocypode quadrata (Fabricius) on an ocean beach: scavengers or predators? Journal of Experimental Marine Biology and Ecology. 1978; 31:67-82.
  • Sakai K, Türkay M. Revision of the genus Ocypode with the description of a new genus, Hoplocypode (Crustacea: Decapoda: Brachyura). Memoirs of the Queensland Museum – Nature. 2013; 56 (2): 665–793.
  • Shih HT, Ng PKL, Davie PJF, Schubart CD, Türkay M, Naderloo R, Jones D, Liu MY. 2016. Systematics of the family Ocypodidae Rafinesque, 1815 (Crustacea: Brachyura), based on phylogenetic relationships, with a reorganization of subfamily rankings and a review of the taxonomic status of Uca Leach, 1814, sensu lato and its subgenera. The Raffles Bulletin of Zoology, 64:139-175.
 

 

Agradecimentos aos colegas André Benedito, Hector Barrabin, Mário Celso Micaeli, Carlos A. P. Parchen, Ricardo Moura, Rodrigo Valença Cruz, Ines da Cunha Seppi, Roberta Capra e Flávio Mendes, e também ao colega norte-americano Bill O´Connor pela cessão das fotos e vídeo para o artigo. Agradecemos também à aquarista norte-americana Felicia McCaulley por permitir o uso das suas imagens do terrário. Veja seu artigo  aqui  .



As fotografias de Cinthia Emerich estão licenciadas sob uma Licença Creative Commons. As demais fotos têm seu "copyright" pertencendo aos respectivos autores.
 
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