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"Chilina"  
Artigo publicado em 10/05/2014, última edição em 03/06/2018  



Chilina Gray, 1828

 

 

Introdução e Taxonomia

 

A família Chilinidae é endêmica para o sul da América do Sul e está representada pelo único gênero Chilina, atualmente com cerca de 36 espécies descritas. O número de espécies que ocorre no Brasil é controverso, desde 14 espécies a 4 espécies, dependendo do autor. Seu nome é uma alusão ao Chile, onde foi coletado o espécie-tipo, e onde são encontradas muitas espécies deste gênero. Dentre as espécies brasileiras, podemos citar C. fluminea (Maton, 1809), C. parva Martens, 1868, C. rushii Pilsbry, 1911 e C. globosa Frauenfeld, 1881.

São gastrópodes pulmonados, parentes dos Planorbídeos, Physas e Lymnaeas, e dentro deste grupo, a Chilinidae é considerada uma das famílias mais antigas e primitivas conhecidas, possivelmente foi um dos primeiros grupos pulmonados a se adaptarem ao ambiente aquático. Análises moleculares também situam a Chilinidae em uma posição basal dentre os Hygrophila.

 

 


Chilina globosa, coletados no Rio Itajaí-Açú, Blumenau, SC. Note o "dente" columelar, típico deste gênero. Foto gentilmente cedida por Aisur Ignacio Agudo-Padrón.



Distribuição e Habitat

 

Sua distribuição geográfica compreende as regiões de clima temperado e frio da metade austral da América do Sul, abaixo do Trópico de Capricórnio, sendo encontrado no Peru, Chile, Argentina, Paraguai, Brasil, Uruguai e Ilhas Malvinas. No Brasil, tem como limite norte da sua distribuição o município de Araucária, PR.

Habitam águas doces (algumas também em águas salobras) de arroios, rios de correnteza rápida, lagos e lagoas, ocorrendo até 4000 metros de altitude. No Brasil são frequentes nas lagoas costeiras dos estados do Sul. Vivem entre plantas aquáticas, em rochas e outros substratos sólidos, ou ainda em meio ao sedimento de fundo. Em muitas localidades são bastante abundantes, de forma correspondente aos Physidae na América do Norte, especialmente nas regiões mais ao sul. Sua freqüência vai se reduzindo à medida que se estende para o limite norte da sua distribuição.

Algumas espécies têm como habitat típico as paredes rochosas em cascatas montanhosas, como por exemplo o Chilina parva no Brasil e o Chilina megastoma na Argentina.

 

 


Distribuição geográfica do gênero Chilina. Adaptado de Pilsbry HA. (1911). Non-marine mollusca of Patagonia. Princeton: The University. p 628, fig 36. Imagem original Google Maps.




Chilina parva, fotografados em áreas rasas e de substrato rochoso, em uma pequena tributária do Rio Jacuí, em Ilha da Pintada, RS. Fotos de Walther Ishikawa.











Chilina parva e Chilina cf. rushii, fotografados em uma área de pesca do Rio Jacuí, em Ilha da Pintada, RS. A região era bastante degradada, com lixo, telhas e cacos de azulejos. Bastante numerosos, os caramujos foram encontrados em  áreas rasas, sob e sobre estes substratos, junto a Potamolithus e Heleobia. Fotos de Walther Ishikawa.




Biótopo típico do Chilina parva, Cascata da Borússia, bacia do Caraá, Osório, RS. Os caramujos foram coletados aderidos às rochas nas paredes da cachoeira. Fotos de Aisur Ignacio Agudo-Padrón.




Chilina cf. ilanguihensis, fotografados no lago Llanquihue, Puerto Varas, Chile. A última foto mostra os caramujos caminhando sobre o substrato rochoso. Note os tentáculos cefálicos curtos e triangulares, lembrando um Lymnaea. Fotos de Walther Ishikawa.



Morfologia

 

Dentre os Pulmonados, somente os Chilinidae e Lymnaeidae têm conchas com espiralização destra. Ou seja, vistas de baixo, como ao caminharem no vidro do aquário, com o ápice da concha para baixo, a abertura se localiza do nosso lado esquerdo (veja fotos). 

Possui concha globosa, oval a alongada, córnea, levemente estriada longitudinalmente. Ápice agudo e curto, formando três a quatro e meia voltas pouco convexas, o último giro bastante expandido. Abertura oval e ampla, com o lábio externo cortante e borda columelar branca com uma prega ou dente e uma leve dobra acima desta. Mede até 23 mm. Concha amarelada, castanha ou esverdeada, podendo apresentar uma a cinco bandas transversais de manchas castanho-avermelhadas a amarelas, interrompidas ou reduzidas a simples pontos espaçados. Periostraco sempre presente, de cor amarelo-oliva com faixas marrom escuras em um padrão de zigue-zague.

Cabeça com grandes tentáculos labiais, os tentáculos cefálicos são curtos, achatados e triangulares. Pequenos olhos pigmentados escuros. Pé largo e curto. Não possui opérculo.





Chilina rushii
, lectotipo coletado por W. H. Rush no Rio Uruguai em Fray Bentos (Uruguai). Exemplar da Coleção Malacológica da Academia de Ciências naturais, Filadélfia, EUA. Veja o link ao final do artigo.




Chilina cf. rushii, coletado em Ilha da Pintada, RS. Fotos de Walther Ishikawa.

 


Chilina fluviatilis, fotos gentilmente cedidas por Jose Liétor Gallego. É uma das espécies encontradas no Brasil.



Chilina fluviatilis, espécimes coletados no Rio de la Plata, en Ribera Norte (Argentina). O exemplar maior mede 19 mm, e o menor (à direita) 12 mm. Note como exemplares menores possuem padronagens mais ricas e bem demarcadas. Fotos gentilmente cedidas por Alec Earnshaw.





Chilina cf. rushii, coletados em Ilha da Pintada, RS. Nas fotos são vistos também alguns Potamolithus. Fotos de Walther Ishikawa.



Chilina cf. rushii caminhando no vidro do aquário, junto a um Heleobia piscium Note o pé curto, e o aspecto das antenas labiais e cefálicas. Fotos de Walther Ishikawa.


 

Reprodução

 

Semelhante a outros pulmonados, são hermafroditas, e depositam ovos agrupados em meio a uma massa gelatinosa, aderida a substratos sólidos, na forma de uma fileira de ovos em zig-zag. Na natureza, sua fecundidade é baixa, com ciclos anuais, reproduzindo-se somente uma vez ao ano, no inverno. O tempo para a eclosão dos ovos é mais longo do que outros pulmonados, de cerca de 28 dias. Sua longevidade é estimada em 2,5 anos.


 



Oviposição de Chilina cf. rushii em aquário. Um pequeno Potamolithus pode ser visto na última imagem. Fotos de Walther Ishikawa.



Cacho de ovos de Chilina cf. rushii em aquário, depositado acima do nível da água, próximo da saída de água do filtro. Foto de Walther Ishikawa.



Ovos de Chilina cf. rushii com 8 dias, já com os embriões visíveis em movimento. Fotos de Walther Ishikawa.




Desenvolvimento dos ovos de Chilina cf. rushii, fotos de Walther Ishikawa.








Bebês recém-nascidos, fotos de Walther Ishikawa.



Três filhotes, entre 1 mês e algumas semanas de idade, note a escala com o adulto, um ácaro oribatídeo e copépodes. Foto de Walther Ishikawa.







Três meses de idade, já com a padronagem na concha mais demarcada. Fotos de Walther Ishikawa.





Cinco meses, com um adulto. Fotos de Walther Ishikawa.




Manutenção em Aquários

 

Baseados nos sítios de coleta, são espécies adaptadas a ambientes de águas frias, bem oxigenadas e duras. Por exemplo, Chilina fluminea é encontrado em locais com temperatura d’água entre 12 e 24ºC e dureza de 50 GH.

Pouquíssimos são os relatos de criação destes caramujos em aquários, principalmente entre aquaristas do Chile. Diferente dos demais pulmonados, parece ser um caramujo mais difícil de ser mantido, necessitando tanques de temperaturas mais baixas, com água dura e bastante oxigenada. Sua fecundidade também é bem baixa, ao contrário dos demais pulmonados, que em pouco tempo se tornam pragas em aquários. Sua alimentação é não-seletiva, mas o componente principal da sua dieta na natureza são algas diatomáceas.
















Chilina cf. rushii em aquário.
Fotos de Walther Ishikawa.





Chilina cf. rushii se alimentando de algas (perifíton) no vidro do aquário. Note as marcas dos seus dentes  nas algas.
Foto de Walther Ishikawa.









Chilina cf. dombeyana, espécimes fotografados no Chile por Chris Lukhaup. Note a variação na forma e padronagem da concha. Detalhes da cabeça do animal podem ser vistos na segunda foto.


 

Aspectos médico-sanitários

 

Algumas espécies deste gênero de caramujo têm importância médico-sanitária, em virtude de serem hospedeiros intermediários de vermes relacionados à Dermatite Cercariana, também conhecida como “dermatite do nadador”, “dermatite do pescador” ou “dermatite de banhista”. É uma reação inflamatória cutânea à penetração de cercárias de trematódeos da família Schistosomatidae, parentes do Schistosoma mansoni, mas que parasitam aves, outros mamíferos e, ocasionalmente, répteis. Não sendo um hospedeiro definitivo adequado, estas larvas morrem algum tempo após penetrar no corpo de seres humanos, não progredindo para doença, mas causam manifestações cutâneas resultantes da penetração das larvas. Temos como exemplos Chilina gibbosa e Chilina fluminea na Argentina.

 

 

 

 

Bibliografia:

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Agradecimentos ao colega malacologista brasileiro Aisur Ignacio Agudo-Padrón pela cessão da foto, e auxílio na identificação dos exemplares chilenos e gaúchos. Agradecemos também ao malacologista espanhol Jose Liétor Gallego ( El Rincón del Malacólogo ) e ao naturalista argentino Alec Earnshaw ( Fauna Silvestre de Argentina ) pela cessão das fotos para o artigo. Vejam também a Coleção Malacológica da Academia de Ciências Naturais, Filadélfia,   aqui


As fotografias de Walther Ishikawa e da Coleção Malacológica da Academia de Ciências Naturais, Filadélfia estão licenciadas sob uma Licença Creative Commons. As demais fotos têm seu "copyright" pertencendo aos respectivos autores.
 
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