Lista de Espécies Ameaçadas do MMA 2014 – O que mudou?
Em dezembro de
2014, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) publicou uma nova Lista Nacional
Oficial de Espécies da Fauna Ameaçadas de Extinção. Esta lista foi o resultado
de um longo processo de avaliação feito pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) entre 2010 e 2014, onde
foram avaliados 12.256 táxons da fauna, dos quais 3.332 invertebrados
(terrestres, marinhos e de água doce). Também foi firmado um termo de
reciprocidade entre o ICMBio e a União Internacional para a Conservação da
Natureza (IUCN).
As espécies
foram categorizadas segundo os critérios da IUCN, de uma forma muito mais
estruturada do que na lista de 2004. Há também maior clareza no nível de ameaça
de cada espécie. Vamos então inicialmente entender quais são estas categorias
de ameaça da IUCN:
Significado das Categorias da IUCN para Espécies Extintas
e Ameaçadas
A IUCN, segundo
a versão 3.1 (IUCN, 2001), distingue três níveis de ameaça para as espécies:
Criticamente
em Perigo (CR) - quando
corre risco extremamente alto de extinção na natureza em futuro imediato.
Em
Perigo (EN) - corre risco
muito alto de extinção na natureza em futuro próximo.
Vulnerável
(VU) - corre risco alto
de extinção na natureza em médio prazo.
Embora estas
categorias sejam mencionadas na atual lista brasileira, todas as espécies que
correm risco de extinção são legalmente consideradas “Ameaçadas”, sem distinção
destas três categorias do ponto de vista legal.
Existem algumas
outras categorias utilizadas pela IUCN, para classificar as espécies
não-ameaçadas:
Quase
Ameaçada (NT): quando não
atinge o critério para ameaçado, mas está bem próximo de VU, de tal modo que,
se não for protegido, tornar-se-á rapidamente ameaçado.
Não
ameaçada (De Menor
Preocupação, pela IUCN) (LC): significa uma espécie que foi avaliada e sobre a qual as
informações existentes não justificam sua inclusão em uma das categorias de
risco.
Deficiente
em Dados (DD): quando os
dados existentes sobre ele não permitem saber se está ou não ameaçado. As
espécies nessa categoria requerem maior número de pesquisas, para que se possa
chegar a uma conclusão segura sobre seu status de conservação.
Não
Avaliada (NA): táxons não
avaliados por meio dos critérios de avaliação de risco definidos.
Extinto
(EX)
Extinto
na Natureza (EW)
Os resultados
apontam 1.173 táxons ameaçados no Brasil, que estão listados em duas Portarias
publicadas pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), a que aborda os peixes e
invertebrados aquáticos (475 táxons) é a Portaria MMA nº 445, de 17 de dezembro
de 2014.
O processo de
Avaliação do Risco de Extinção da Fauna Brasileira identificou, além das espécies
ameaçadas, as espécies consideradas Quase Ameaçadas (NT) e com Dados
Insuficientes (DD) em território brasileiro. Como já mencionado, espécies NT
são aquelas que, embora não consideradas ameaçadas no momento (ou seja, não
fazem parte da Lista Vermelha), se aproximam de alguma categoria de ameaça,
sendo provável que se qualifiquem como ameaçadas em um futuro próximo. Espécies
DD são aquelas cujas informações disponíveis, como distribuição geográfica,
tamanho populacional ou mesmo ameaças, não são suficientes ou adequadas para
uma avaliação de seu risco de extinção. As espécies classificadas como NT ou DD
são consideradas prioritárias para pesquisas sobre o estado de conservação.
No artigo, as espécies da Lista Vermelha estão identificados dentro de uma caixa amarela, e as demais (NT, DD e LC) em caixas brancas.
A lista
anterior era de dez anos atrás, e ocorreram algumas mudanças importantes, com
inclusões e exclusões de espécies. Já havia no nosso site um artigo abordando
aspectos legais de invertebrados, onde se discutia bastante as espécies da Lista
Vermelha de 2004, pode ser vista aqui. A idéia inicial era somente atualizar as informações do
artigo, mas achamos interessante inicialmente publicar um artigo complementar,
e talvez no futuro sintetizá-los em um único artigo. Isto porque alguns itens
desta nova lista têm gerado controvérsias entre pesquisadores, e listas
regionais ainda estão sendo atualizadas. Vamos destacar especialmente as
inclusões e exclusões de espécies, e as conseqüências para nós, aquaristas.
Aegla
perobae, espécie incluída na nova Lista Vermelha 2014,
como CR. Foto do Prof. Sergio Luiz de Siqueira Bueno (LEEUSP).
Crustáceos
Para este grupo,
o destaque é a inclusão de um grande número de Aeglas, pequenos decápodes anomuros (parentes de Ermitões) que são
encontrados nos estados do sul do Brasil. A lista anterior continha somente
três espécies cavernícolas. Estas três permanecem na lista, e foram acrescidas
23 outras espécies. Esta abordagem é consensual entre os pesquisadores, Aeglas são animais particularmente
sensíveis a degradações ambientais, com um alto grau de endemismo, algumas
espécies são conhecidas somente na sua localidade tipo. As espécies são estas:
Já presentes em
2004:
CR
Aegla cavernicola Türkay, 1972
CR
Aegla leptochela Bond-Buckup & Buckup, 1994
CR
Aegla microphthalma Bond-Buckup & Buckup, 1994
|
Novas espécies
da lista de 2014:
CR
Aegla brevipalma Bond-Buckup & Santos, 2012
CR
Aegla franca Schmitt, 1942
CR
Aegla lata Bond-Buckup & Buckup, 1994
CR
Aegla perobae Hebling & Rodrigues, 1977
CR
Aegla renana Bond-Buckup & Santos, 2010
EN Aegla
camargoi Buckup & Rossi, 1977
EN Aegla
inermis Bond-Buckup & Buckup, 1994
EN Aegla
itacolomiensis Bond-Buckup & Buckup, 1994
EN Aegla
leachi Bond-Buckup & Santos, 2012
EN Aegla
manuinflata Bond-Buckup & Santos, 2009
EN Aegla
oblata Bond-Buckup & Santos, 2012
EN Aegla
obstipa Bond-Buckup & Buckup, 1994
EN Aegla
plana Buckup & Rossi, 1977
EN Aegla
pomerana Bond-Buckup & Buckup, 2010
EN Aegla
rossiana Bond-Buckup & Buckup, 1994
EN Aegla
strinatii Türkay, 1972
EN Aegla
violacea Bond-Buckup & Buckup, 1994
VU Aegla grisella
Bond-Buckup &
Buckup, 1994
VU Aegla inconspicua
Bond-Buckup &
Buckup, 1994
VU Aegla leptodactyla
Buckup & Rossi,
1977
VU Aegla ligulata Bond-Buckup & Buckup, 1994
VU Aegla spinipalma Bond-Buckup & Buckup, 1994
VU Aegla spinosa Bond-Buckup & Buckup, 1994
|
Fora da Lista
Vermelha, alguns Aegla foram
categorizadas como NT ou DD, sugerindo-se maior atenção:
NT Aegla
muelleri Bond-Buckup & Buckup, 2010
NT Aegla
prado Schmitt, 1942
DD Aegla
franciscana Buckup & Rossi, 1977
DD Aegla
jarai Bond-Buckup & Buckup, 1994
DD Aegla
longirostri Bond-Buckup & Buckup, 1994
DD Aegla
marginata Bond-Buckup & Buckup, 1994
DD Aegla
parana Schmitt, 1942
DD Aegla
paulensis Schmitt, 1942
DD Aegla
platensis Schmitt, 1942
DD Aegla
uruguayana Schmitt, 1942
|
Guaiamum, Cardisoma guanhumi, incluído na Lista Vermelha 2014 como CR. Foto de Walther Ishikawa.
Para os demais
decápodes, só há dois caranguejos. Uma interessante surpresa foi a inclusão do
Guaiamum (Cardisoma guanhumi) como CR, bastante usada na alimentação regional
nos estados do nordeste. A justificativa é o grande declínio populacional desta
espécie evidenciada nas últimas décadas, tanto por captura excessiva quanto
degradação ambiental. É uma inclusão que trará grandes consequências práticas, porque é uma espécie de importância econômica, com famílias de baixa renda dedicando-se à sua criação, e restaurantes especializados na sua culinária. Da lista de 2004, permanece o Caranguejo-amarelo,
atualmente classificado como EN.
CR
Cardisoma guanhumi Latreille, 1828
EN Johngarthia
lagostoma (H. Milne Edwards, 1837) – em 2004 era classificado como Gecarcinus lagostoma H. Milne Edwards, 1837
|
Outros
braquiúros estuarinos foram categorizados como NT, inclusive outra especie de importância comercial, o Uçá, e alguns terrestres/límnicos
como DD, sugerindo-se maior atenção:
NT Uca
uruguayensis Nobili, 1901
NT Uca
victoriana Von Hagen, 1987
NT Ucides
cordatus (Linnaeus, 1763)
NT Neohelice
granulata (Dana, 1851)
DD Brasiliothelphusa
dardanelosensis Magalhães & Türkay, 2010
DD Fredius
ykaa Magalhães, 2009
DD Kingsleya
gustavoi Magalhães, 2004
DD Kingsleya
junki Magalhães, 2003
|
Camarão-filtrador Atya scabra, retirado da Lista Vermelha 2014, atualmente como NT. Foto de Cleidson Silva.
Em relação aos
camarões de água doce, não há nenhuma espécie na lista atual. As três espécies
da lista de 2004 foram excluídas, sendo atualmente classificadas como NT ou DD.
Com isto, volta a ser legalizada a criação dos Camarões-Filtradores Atya. Porém, notem que ambas espécies ainda constam como NT ou DD. Desta forma, embora a rigor legalizadas, sugerimos que ainda se evite a captura ou manutenção destes animais em aquários:
NT Atya
scabra (Leach, 1815)
DD Atya
gabonensis Giebel, 1875
DD Macrobrachium
carcinus (Linnaeus, 1758)
|
Além destas
três espécies, quatro outros camarões são destacados na lista DD, inclusive a espécie mais comum de "Pitú":
DD Cryphiops
brasiliensis (Gomes Corrêa, 1973)
DD Macrobrachium
acanthurus (Wiegmann, 1836)
DD Macrobrachium
denticulatum Ostrovski, Fonseca & Silva-Ferreira, 1996
DD Pseudopalaemon
chryseus Kensley & Walker, 1982
|
Lagostim nativo Parastacus brasiliensis, não consta na Lista Nacional 2014, e atualmente nem na lista estadual. Porém, é classificado como DD, veja comentários abaixo. Foto de ÉdenTimotheus Federolf.
Um único
lagostim é mencionado na lista DD, o Parastacus
brasiliensis, que, embora nunca fosse listado no Livro Vermelho nacional, constava na lista regional do Rio Grande do Sul de 2002,
e foi retirado da lista atualizada estadual de 2014:
DD Parastacus
brasiliensis (von Martens, 1869)
|
Vale destacar
que um consenso de especialistas recentemente avaliou o grau de ameaça dos Parastacus (sem nenhuma relação com o
ICMBio), sugerindo-se as categorias abaixo. Assim como os Atya, todos são DD ou NT, assim, embora legalizadas, a nossa sugestão é a de ainda se evite a captura e manutenção em cativeiro destes animais:
NT Parastacus
defossus Faxon, 1898
DD Parastacus
brasiliensis (von Martens, 1869)
DD Parastacus
laevigatus Buckup and Rossi, 1980
DD Parastacus
pilimanus (von Martens, 1869)
DD Parastacus
varicosus Faxon, 1898
DD Parastacus
saffordi Faxon, 1898
|
Talvez a maior
surpresa da atual lista de 2014 seja a exclusão do anfípode cavernícola Hyalella caeca Pereira, 1989, que nem ao
menos é mencionado nas listas DD ou NT. Pode ser uma falha dos revisores, neste
caso, será corrigida em breve. Diversos outros pequenos crustáceos (Cladóceros,
Ciclopídeos, etc) constam na lista de espécies DD:
DD Argyrodiaptomus
macrochaetus Brehm, 1937
DD Argyrodiaptomus
neglectus (Wright S., 1937)
DD Argyrodiaptomus
nhumirim Reid, 1997
DD Idiodiaptomus
gracilipes (Dowe, 1911)
DD Notodiaptomus
dubius Dussart & Matsumura-Tundisi, 1986
DD Metacyclops
campestris Reid, 1987
DD Muscocyclops
bidentatus Reid, 1987
DD Muscocyclops
therasiae Reid, 1987
DD Ponticyclops
boscoi Reid, 1987
DD Tropocyclops
federensis Reid, 1991
DD Attheyella
yemanjae Reid, 1993
DD Canthocamptus
campaneri Reid, 1994
DD Murunducaris
juneae Reid, 1994
DD Anchistropus
ominosus Smirnov, 1985
|
Veja a segunda parte do artigo aqui.