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"Potimirim brasiliana"  
Artigo publicado em 12/05/2012, última edição em 19/07/2019  



Potimirim – Potimirim brasiliana

 

Nome em português: Potimirim, Potim, Camarão miúdo, Camarão-neon.

Nome em inglês: -

Nome científico: Potimirim brasiliana Villalobos, 1959

Origem: Somente no Brasil, Estados de BA, RJ, SP, PR e SC.

Tamanho: fêmeas adultas chegam a 2,6 cm
Temperatura da água: 18-28° C
pH: 6,2-6,8

Dureza: indiferente
Reprodução
: controverso, vide texto

Comportamento: pacífico
Dificuldade: fácil

 

 

Apresentação

            O Potimirim é um pequeno camarão brasileiro de água doce, belo e pacífico, cada vez mais popular no hobby. Das seis espécies de Potimirim, duas ocorrem no Brasil, P. brasiliana e P. potimirim.

Muitas fontes ainda descrevem esta espécie como Potimirim glabra. A taxonomia dos Potimirim é confusa, e ainda é motivo de caloroso debate. Alguns autores não consideram válida P. brasiliana, julgando-o um sinônimo de P. glabra. Por este motivo, a maioria das fontes cita as duas espécies brasileiras como sendo P. glabra e P. potimirim. Pela ótica destes autores, a distribuição do P. glabra é bastante ampla, desde a América Central (faces Atlântica e Pacífica), até o Sul do Brasil. Entretanto, existe uma belíssima revisão sobre as espécies de Potimirim (Torati, 2009), bastante cuidadosa e rigorosa, que inclui análises moleculares e filogenéticas além de morfológicas. O autor revalida o P. brasiliana, e restringe sua distribuição para somente o Sul e Sudoeste do Brasil, considerando o P. glabra outra espécie, exclusiva da face Pacífica da América Central. Embora ainda não validada e oficial, será esta a taxonomia que seguiremos aqui.

            Etimologia: Potimirim vem do Tupi-guarani Poti (camarão) e Mirim (pequeno); brasiliana significa nativo do Brasil.


Potimirim brasiliana, foto de Cinthia Emerich.




Origem

O Potimirim brasiliana é uma espécie exclusiva brasileira, com uma distribuição mais restrita, sendo encontrado somente nos Estados de BA, RJ, SP, PR e SC. São bem comuns em rios litorâneos da Mata Atlântica, em locais onde a água já é doce.

São encontrados em grandes colônias, muitas vezes simpátricos com o P. potimirim, mas tende a habitar ambientes mais afastados do mar, rios mais rasos, límpidos e com maior correnteza, de fundo rochoso. Vivem aderidos à vegetação marginal submersa, plantas aquáticas, sobre folhas mortas, rochas e cascalho.






Distribuição geográfica do Potimirim brasiliana no Brasil. Imagem original Google Maps; dados de Melo GAS 2003 e Torati LS 2009.




Um riacho em Ubatuba, SP, habitat do Potimirim brasiliana. Foto de Minoru Nagayama.



Potimirim brasiliana, foto de Cinthia Emerich.


Aparência

 

São pequenos camarões com o formato do corpo muito parecido com outros camarões anões ornamentais. Em especial, lembram bastante os Camarões Amano (Caridina multidentata), levando a frequentes erros de identificação no comércio. Amanos são camarões maiores, com típicas manchas pequenas e escuras, mas a diferenciação pode ser problemática em animais menores. Como agravante, vale lembrar que alguns fornecedores vendem esta espécie chamando-os de “Amano Brasileiro” ou “Caridina Brasileiro”.

Os dois primeiros pares de pernas possuem tufos de cerdas terminais em forma de leque nas extremidades, semelhante aos Filtradores Atya. Quando fechadas, se assemelham a um pincel.

            Sua coloração é extremamente variável, desde indivíduos praticamente transparentes até animais opacos e escuros, de cor marrom ou verde. O padrão mais comum é um corpo translúcido e o dorso de coloração alaranjada, com uma faixa longitudinal amarelada, mediana, se estendendo por quase todo seu corpo, lembrando bastante a padronagem de algumas populações de Atya scabra. Pode ter uma borda verde oliva escura ou negra margeando a faixa clara. Ao invés de uma faixa longitudinal clara no dorso, alguns indivíduos podem ter um padrão com ramificações transversais, semelhante a uma “espinha de peixe”. Outras colorações possíveis, mais incomuns, são indivíduos azulados, ou claros com manchas avermelhadas. A coloração não permite a diferenciação entre as duas espécies de Potimirim.

Geralmente é possível a diferenciação entre o P. brasiliana e o P. potimirim através do aspecto do rostro. Existem várias outras diferenças, mas de difícil análise em animais vivos. Seu rostro é bastante curto, mais do que o do P. potimirim. Nos machos o rostro raramente ultrapassa o primeiro segmento do pedúnculo antenular, sendo que em fêmeas ele pode ser curto como nos machos, ou alcançar até a metade do comprimento do segundo segmento. A margem superior do rostro é bastante curvada inferiormente, em ambos os sexos.



Close no rostro curto de um Potimirim brasiliana, foto de Felipe Aoki.


 

Parâmetros de Água

 

Originam-se de rios e córregos límpidos e com rápida correnteza. É uma espécie relativamente adaptável, na natureza são mais comuns em águas montanhosas e frias, com uma temperatura de cerca de 20° C, mas são vistos também em regiões marginais e poças rasas, onde a temperatura pode ser bastante elevada, atingindo até 30º C. São ambientes de pH ácido, em torno de 6,4. A dureza da água não é crítica. Como outros camarões, são bastante sensíveis a compostos nitrogenados, e metais pesados são mortais para estes animais.



Casal de Potimirim brasiliana, foto de Cinthia Emerich.


Dimorfismo Sexual

 

As fêmeas são maiores do que os machos, e têm algumas estruturas anatômicas mais desenvolvidas. Os espinhos antenal e pterigostomial estão presentes somente nas fêmeas. Os machos possuem um apêndice em forma de leque no segundo pleópode, mas que dificilmente é visível em indivíduos vivos.

Embora o Potimirim mexicana apresente hermafroditismo protrândrico, sabe-se que as duas espécies brasileiras de Potimirim são dióicos, sem evidências de hermafroditismo (gonocóricos).




Potimirim brasiliana, casal e fêmea ovada, filmados em Ubatuba, SP. Vídeos de Mírian Nunes dos Santos.





Controvérsias a respeito da Reprodução



Existem controvérsias a respeito da reprodução destes camarões, com experiências distintas entre zoólogos pesquisadores e aquaristas. Na literatura científica, o único registro completo da reprodução destes camarões foi feita pela Dra. Fúlvia Molina (tese de doutorado, 1987), que acompanhou o desenvolvimento destes animais desde a eclosão dos ovos até a fase juvenil. A Dra. Fúlvia gentilmente cedeu seu trabalho completo (ainda não publicado) para a nossa consulta, à qual somos extremamente gratos.



Potimirim brasiliana, fêmea ovada. Foto de Minoru Nagayama.



Casal de Potimirim brasiliana, fêmea ovada atrás. Foto de Minoru Nagayama.

 

Segundo sua pesquisa (e de outros autores), Potimirim são camarões que se reproduzem ao longo do ano, com picos em épocas mais quentes e chuvosas. Todos os Potimirim são espécies com reprodução primitiva, gerando ovos pequenos e em grande número, dos quais nascem formas planctônicas de nado livre. No seu trabalho, ela demonstra que as formas larvares dependem totalmente de água salobra para seu adequado desenvolvimento, as larvas morrendo em 8 dias se mantidas em água doce.

Uma fêmea em boas condições produz cerca de 500 (até 900) pequenos ovos, alongados, medindo cerca de 0,5 mm no maior eixo. Os ovos têm uma coloração inicialmente marrom escura, passando a marrom claro esverdeado ao final do desenvolvimento. O tempo de desenvolvimento dos ovos varia com a temperatura, entre duas e quatro semanas.

A eclosão ocorre em água doce. Na natureza, fêmeas ovígeras são bem mais comuns de serem vistas distantes do litoral (ao contrário do P. potimirim). Entretanto, a taxa de sucesso na eclosão dos ovos é maior em água salobra, numa salinidade de cerca de 8%o, talvez por ser uma espécie que migrou mais recentemente para o continente. A eclosão dos ovos ocorre geralmente à noite. As larvas são liberadas, medindo cerca de 1,0~1,5 mm ao nascerem. Ao contrário de outras espécies, as larvas zoea I são bentônicas, permanecendo aderidas a algum substrato. Larvas zoea I não se alimentam, consumindo nutrientes do saco vitelínico. A partir de zoea II se alimentam de zooplâncton, podem ser alimentadas com náuplios recém-eclodidos de Artêmia em cativeiro.

As larvas se desenvolvem melhor numa salinidade de cerca de 14~16%o, numa temperatura entre 21 e 26º C. As larvas passam por 11 estágios de zoea e um megalopa, até se tornarem pós-larvas, num período de cerca de 40 dias. A autora conseguiu uma taxa de sobrevivência de 27%, o que pode ser considerado extremamente alto para uma espécie pequena, anfídroma e de reprodução primitiva.



Potimirim brasiliana, fêmea ovada. Note como os ovos são pequenos, indicando reprodução primitiva. Foto de Minoru Nagayama.




Potimirim brasiliana, fêmea ovada, fotografada em Iguape, SP. Foto de Fábio Rosa Sussel.



Por outro lado, existem alguns relatos entre aquaristas, descrevendo seu sucesso na reprodução de Potimirim em água doce. São todos aquaristas experientes, muitos deles criadores profissionais, que relatam o surgimento misterioso de juvenis nos seus aquários, sem necessidade de água salobra. Todos descrevem tanques de grandes dimensões (cerca de 500 litros), estabilizados e densamente plantados.

O sucesso na reprodução parece relacionado a um aporte grande de zoo e fitoplâncton (microalgas, rotíferos, paramécios, etc), já presentes nestes aquários, ou introduzidos para alimentação. Alguns relatam um sucesso maior em água mais acidificada e mole.

Outro aspecto interessante é que alguns aquaristas também relatam a presença de Potimirim em ambientes cuja migração a montante das larvas dos estuários seria impossibilitada, por exemplo, com interposição de altas cachoeiras, ou com cachoeiras desaguando diretamente no mar, sem uma área estuarina de água salobra. Mesmo na literatura científica, existem alguns poucos registros de coleta em ambientes mais continentais (noroeste de SP, P. brasiliana, e interior da BA, P. potimirim).




Larvas recém-eclodidas de
Potimirim brasiliana, foto de Cinthia Emerich.

 

Não se sabe ao certo os motivos desta discrepância. Uma possibilidade é de que existam sub-espécies ou linhagens de Potimirim brasiliana que são capazes de se reproduzir em água doce. Isto já é descrito em várias espécies de Macrobrachium, como o M. amazonicum e M. niponense (neste último até a forma de reprodução é distinta, entre populações “primitivas’ e “abreviadas”). Os Potimirim são considerados animais que migraram mais recentemente para o continente, ainda em processo de especiação. E mesmo analisando o sucesso na reprodução, usando-se água doce ou salobra, a taxa de sobrevivência parece maior em água salobra. Talvez haja algum grau de flexibilidade nesta dependência à água salobra, com uma chance de sucesso maior nestas condições, mas sem uma dependência total em algumas populações.

Certamente existem várias lacunas de conhecimento que precisam ser esclarecidas. Se algum de vocês tiver sucesso na reprodução em água doce, gostaríamos muito de saber!

 


Potimirim brasiliana, foto de Felipe Aoki.


Comportamento

 

Pequenos e pacíficos, não brigam com outros animais nem com camarões da mesma espécie. Pelo contrário, por serem pequenos, são presas fáceis para peixes e outros predadores, deve-se escolher cuidadosamente seus companheiros de aquário, evitando espécies grandes ou agressivas. Em especial, tornam-se vulneráveis após a ecdise.

São camarões gregários, formando grandes colônias na natureza, desta forma sugere-se a manutenção desta espécie em grupos.

Possui o hábito de saltar do aquário, talvez um mecanismo de defesa por serem encontrados em locais rasos na natureza. Por este motivo, é interessante manter o aquário sempre bem tampado. Na natureza realizam longas migrações correnteza acima, percorrendo distâncias em locais secos arrastando-se sobre rochas. Mesmo no aquário, podem escalar rochas semi-emersas, canos de filtros e o próprio vidro, outro motivo pelo qual é fundamental manter o aquário bem tampado.

 


Potimirim brasiliana, fêmea ovada. Foto de Felipe Aoki.


Alimentação

 

Embora possuam tufos de cerdas nas primeiras pernas, semelhante aos Atyas, os Potimirim possuem hábito alimentar distinto. Eles utilizam estas cerdas para raspar e varrer superfícies, ao invés de filtrar passivamente a água. Quando abertos, estas estruturas formam amplos leques, capazes de varrer uma grande área de superfície. Quando fecham, as cerdas convergem acumulando detritos na sua face interna, formando um bolo, que é levado à boca.

Possuem alimentação onívora e detritívora, coletando microalgas e detritos na superfície de rochas, plantas e outros objetos submersos. Por este motivo, vive melhor em tanques antigos e bem maturados, com maior riqueza de microalgas. Aceitam bem ração industrial.
 

 


Potimirim brasiliana, fêmea ovada se alimentando. Foto de Minoru Nagayama.



Bibliografia:

  • Melo GAS. Manual de Identificação dos Crustacea Decapoda de água doce do Brasil. São Paulo: Editora Loyola, 2003.
  • Torati LS. Revisão taxonômica das espécies brasileiras de Potimirim Holthuis, 1954 e filogenia do grupo baseado em dados moleculares. Dissertação (Mestre em Ciências – Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas – área de concentração Biologia Comparada) – Departamento de Biologia, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Ribeirão Preto 2009.
  • Molina FMLR. Biologia de Potimirim brasiliana Villalobos, 1959 (Crustacea, Decapoda, Atyidae). Dissertação (Doutor em Ciências – Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas) – Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP 1987.
  • Lima GV, Silveira CM, Oshiro LMY. Estrutura populacional dos camarões simpátricos Potimirim glabra e Potimirim potimirim (Crustacea, Decapoda, Atyidae) no rio Sahy, Rio de Janeiro, Brasil. Iheringia, Sér. Zool. 2006  Mar; 96(1): 81-87.
  • Lima GV, Oshiro LMY. Partição ambiental de Potimirim glabra (Kingsley) e Potimirim potimirim (Müller) (Crustacea, Decapoda, Atyidae) no rio Sahy, Mangaratiba, Rio de Janeiro, Brasil. Rev. Bras. Zool. 2002, 19(Suppl. 2), 175-179.
  • Lima GV, Oshiro LMY. Aspectos reprodutivos de Potimirim glabra (Kingsley) (Crustacea, Decapoda, Atyidae) no Rio Sahy, Mangaratiba, Rio de Janeiro, Brasil. Rev. Bras. Zool. 2002  Sep; 19(3): 861-866.
  • Hoffmann P. Ecologia populacional e reprodutiva de Potimirim glabra (Kingsley, 1954) (Caridea, Atyidae) em riachos da região de Ubatuba-SP. Dissertação (Mestre em Ciências – Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas - Área de Zoologia) –Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista (UNESP), Campus de Botucatu. Botucatu, SP 2007.
  • Alonso-Reyes MDP, Bortolini-Rosales JL, Álvarez F. Análisis discriminante aplicado a los grupos sexuales de Potimirim mexicana, camarón hermafrodita protándrico. Revista Mexicana de Biodiversidad, Nº. Extra 81, 2010, págs. 187-192.
  • Grilli N, Terossi M, Mantelatto F. Sexual system of the freshwater shrimps of the genus Potimirim Holthuis, 1954 (Decapoda: Caridea: Atyidae): is there a pattern in the genus? Marine and Freshwater Research, 2014, ahead of print.
  • Rocha SS, Bueno SLS, Shimizu RM, Mantelatto FL. (2013). Reproductive biology and population structure of Potimirim brasiliana Villalobos, 1959 (Decapoda, Atyidae) from a littoral fast-flowing stream, Sao Paulo state, Brazil. Crustaceana 86, 67–83.



 

Ficha escrita por Minoru Nagayama, Rafael Senfft e Walther Ishikawa

 

Agradecimentos especiais à bióloga Dra. Fúlvia Maria Lúcia Ribeiro Molina, que cedeu integralmente sua tese de Doutorado para nossa consulta, um rico material que aborda a reprodução do Potimirim brasiliana, ainda não publicado. Agradecemos também ao zootecnista Dr. Fábio Rosa Sussel pela cessão da foto para o artigo.



As fotografias de Cinthia Emerich e Felipe Aoki estão licenciadas sob uma Licença Creative Commons. As demais fotos têm seu "copyright" pertencendo aos respectivos autores.
 
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